Artigo de Charles Alcantara mostra que Argentina dá lição ao taxar grandes fortunas.
O exemplo que vem da Argentina
Charles Alcantara*
Não são poucos os estudos e as alternativas indicadas para ajudar o Brasil a sair da crise vivida há tantos anos. Mesmo assim, as soluções apresentadas sempre nos parecem insuficientes. A pandemia do novo coronavírus só agravou aquela que já é a maior chaga brasileira: a desigualdade. Ao contrário do esforço hercúleo do meio científico para vencer a Covid-19, a vacina para ajudar a diminuir a desigualdade sempre esteve ao nosso lado e foi usada em larga escala pelos países desenvolvidos no pós-guerra.
A solução está em mudanças para tornar o sistema tributário mais progressivo. Quem ganha mais deve pagar mais impostos e, quem ganha menos deve pagar menos. Uma receita simples, mas que exige coragem. E agora encontramos na experiência de um vizinho latino-americano um exemplo a ser seguido.
A Argentina acaba de aprovar a taxação de grandes fortunas. Com a mudança, os nossos vizinhos esperam arrecadar mais de R$ 16 bilhões, valor para enfrentamento da pandemia, fomento de crédito e urbanização de bairros populares, como promete o governo local.
Na mesma direção, o presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, declarou que vai aumentar a tributação sobre os super-ricos.
Medidas como a dos argentinos e norte-americanos servem para auxiliar no equilíbrio fiscal do país e ajudar a combater a desigualdade. A constituição brasileira já prevê tal medida, mas esta nunca foi regulamentada. O princípio da capacidade contributiva garante que os cidadãos contribuam de forma progressiva, de acordo com a sua capacidade econômica medida em renda e patrimônio.
O estudo ‘Tributar os Super-ricos para Reconstruir o País’ mostra que é possível incrementar os cofres públicos com R$ 40 bilhões ao ano, apenas com essa tributação prevista na Carta Magna. O montante é superior à expectativa de arrecadação do governo com a reforma administrativa, que fragiliza o atendimento à população e aumenta as brechas para a corrupção.
Um recente estudo divulgado pela Tax Justice Network (Rede de Justiça Fiscal) aponta que os milionários e empresas multinacionais fazem manobras para não pagar impostos. Só no Brasil, são cerca de R$ 79 bilhões, ao ano, perdidos. Deixamos de arrecadar o equivalente a uma reforma da previdência, que prevê economia de R$ 80 bilhões. Somos o quinto país no mundo que mais perde dinheiro por manobras fiscais dos super-ricos, estamos atrás apenas dos Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e França. Os cálculos são baseados nos dados divulgados pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Na mesma medida em que os pobres no Brasil pagam altas cargas de tributos, os super-ricos são poupados. Cada medida que o Estado tome na direção da tributação dessas fortunas é um passo maior em direção à justiça fiscal e social.
Os milionários afirmam que a tributação de grandes fortunas causará a fuga de capitais, mas eles próprios já o fazem através de medidas para não pagar impostos.
Implementar a tributação dos super-ricos é justo, necessário e urgente.
*Presidente do Sindifisco-Pará (Sindicato dos Servidores do Fisco Estadual do Pará) e da Fenafisco (Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital)