Aprovada numa comissão da Câmara sob vaias e protestos de funcionários públicos, a criação da previdência complementar da categoria deve ser concluída na próxima semana. No entanto, emendas apresentadas podem tirar da nova regra as carreiras mais bem remuneradas do poder público.
Votação apertada foi primeiro passo para criar previdência complementar para os Três Poderes. Apreciação de destaques contra a proposta, na semana que vem, será decisiva.
De nada adiantaram a gritaria, as vaias e o tumulto provocado na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público por grupos de servidores. Com um quórum apertadíssimo — 13 votos a favor (o mínimo necessário) e sete contra —, foi finalmente aprovado ontem o projeto de lei que cria o fundo de pensão único do funcionalismo do Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas tudo pode ir por água abaixo caso sejam aprovados determinados destaques de um total de 12 apresentados por parlamentares, que serão votados, separadamente, na quarta-feira que vem. “Tem um que pede, simplesmente, que se acabe com o fundo”, afirmou o relator Silvio Costa, que também é presidente da comissão.
O instrumento legislativo dos destaques permite apenas suprimir artigos do projeto aprovado ou reincluir emendas que foram rejeitadas na votação do substitutivo ao projeto de lei — não pode criar uma outra regra. Uma dessas emendas deixava de fora da nova regra os servidores de carreiras típicas do Estado, do Judiciário e membros do Ministério Público. Ou seja, somente os chamados servidores “barnabés” passariam a ter a aposentadoria paga pelo fundo de pensão.
O relator classificou a maior parte dos destaques de corporativista. Eles foram apresentados por bancadas de partidos que fazem parte da base aliada — PSB, PTB, PcdoB e PDT. Antes de colocá-los em votação, Costa vai procurar o governo. “Vou ver se a ministra Ideli Salvati (de Relações Institucionais) e o ministro Garibaldi Alves (da Previdência Social) se empenham para conseguir a retirada dos destaques”, explicou Costa. Já o PSDB propôs a supressão de três artigos que tratam da administração do fundo, entre eles, o que autoriza o presidente da República a nomear os membros que deverão compor provisoriamente o conselho deliberativo e fiscal do sistema de previdência complementar.
Pela proposta aprovada, quem entrar no serviço público após a sua aprovação terá direito à aposentadoria garantida pelo governo somente até o teto de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), hoje em R$ 3.689,66. Para receber acima desse valor, o servidor terá de contribuir para o fundo complementar — a quantia adicional dependerá da boa administração das contribuições paritárias dos participantes e da União. Os atuais servidores continuarão recebendo seus benefícios, praticamente iguais ao salário da ativa, pelas regras vigentes. Eles podem, se quiserem, aderir ao futuro sistema.
Demora
Apesar da aprovação, tudo indica que o andamento da proposta, que tramita na Câmara desde 2007, ainda vai demorar. O fundo ainda tem de passar pela Comissão de Seguridade Social e Família e pela de Finanças e Tributação. O projeto tramita em caráter terminativo e, se não fosse polêmico, não teria que passar pelo plenário da casa. Mas nem o presidente da Comissão de Trabalho acredita nisso. Silvio Costa está convencido de que, em algum momento, surgirá um requerimento que levará a proposta para o plenário. De lá, se for aprovada, o projeto seguira para a avaliação dos senadores.
Costa atribui a resistência ao fundo ao enorme corporativismo da classe, que tem muito apoio entre os parlamentares. Além da manifestação dentro da Câmara, servidores se juntaram ontem a integrantes do Movimento Sem-Terra (MST) para protestar nos gramados da Esplanada dos Ministérios contra o projeto que cria a previdência complementar e para exigir aumento salarial.
“Se não tivéssemos aprovado o projeto, provavelmente, daqui a uns dez anos, a União não teria recursos para pagar os atuais servidores públicos”, disse o relator. O deficit da Previdência do setor público é crescente. Em 2010, o Tesouro teve que desembolsar R$ 52 bilhões para fechar a conta dos benefícios pagos a 950 mil inativos. Para este ano, o rombo esperado é de R$ 56 bilhões. “Ou estancamos a sangria ou faltará dinheiro daqui a 10 anos para o pagamento dos aposentados do setor público”, assegurou.
CONTRIBUIÇÃO
Hoje, servidores públicos ativos e inativos dos Três Poderes contribuem com alíquota de 11% sobre o salário total para custear as suas aposentadorias e pensões no sistema próprio. Os novos que ingressarem no serviço público a partir da aprovação do fundo complementar contribuirão com 11% até o teto do INSS. Acima disso, a alíquota será de até 7,5%. A União recolherá o mesmo percentual.
Fonte: Vânia Cristino – Correio Braziliense