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16/04/2013

Dívida pública é muito pior que a corrupção, sustenta Charles Alcantara em novo artigo

“A dívida pública brasileira, esta sim, é a mais tenebrosa praga e o mais odioso crime que se perpetra contra o povo brasileiro”. A declaração é do presidente do Sindicato dos Servidores do

Fisco Estadual do Pará (Sindifisco-PA), Charles Alcantara, para quem a corrupção, ao contrário do que se imagina, não é a modalidade de roubalheira que mais afronta ao contribuinte brasileiro.
 
Segundo o sindicalista, a dívida pública – também mais do que superfaturamento de obra, licitações dirigidas, clientelismo, tráfico de influência e propinoduto – é “a mais tenebrosa praga e o mais odioso crime que se perpetra contra o povo brasileiro”, diz Alcantara em artigo publicado em seu blog (http://charlesalcantara.wordpress.com).

O sindicalista informa que, somente nos primeiros três meses de 2013, quase 60% de tudo o que os contribuintes brasileiros pagaram em impostos foram entregues aos “credores” da dívida pública brasileira no mercado financeiro. “Até o dia 1º de abril, foram destinados R$ 325 bilhões principalmente para os especuladores nacionais e estrangeiros”, decifra.

 

Leia a íntegra do artigo:

 

Contribuo, logo exijo

Charles Alcantara
 
Este contribuinte brasileiro, nascido no Pará, de família trabalhadora, pagou, em 2012, mais de R$ 47 mil de imposto de renda, R$ 25 mil de contribuição previdenciária e, mais ou menos, outros R$ 30 mil entre IPVA, IPTU e impostos indiretos incidentes sobre tudo o que consumiu e adquiriu ao longo do ano.
 
Mas este contribuinte, que vive de trabalho honesto, sem enganar, roubar, desviar dinheiro público, extorquir, chantagear, trapacear, a despeito de ter contribuído com cerca de R$ 77 mil para o fundo público, somente em 2012 – sem considerar os outros R$ 25 mil em contribuição previdenciária, que deveriam servir para lhe garantir uma aposentadoria digna e compatível com a contribuição regiamente paga ao longo de dezenas de anos de trabalho – não quer pagar nenhum centavo a menos de imposto.
 
Sente-se aliviado, este contribuinte, porque foi capaz de pagar os seus impostos sem ter sofrido as dores da fome, da falta de abrigo contra as intempéries, dos filhos sem escola e da falta de assistência digna nos momentos de doença, dores por que passam muitos milhões de contribuintes brasileiros.
 
Este contribuinte não quer pagar nenhum centavo a menos de imposto, porque tem a consciência de que sem imposto o Brasil jamais haverá de ser uma nação justa e soberana.
Acontece que este contribuinte, justamente porque contribui para o sustento desta nação, não quer mais aceitar as imoralidades, a safadeza e a roubalheira que os governos e a chamada “classe” política estão fazendo com os impostos pagos pelo povo brasileiro.
 
E não pensem que este contribuinte está falando da corrupção. Não, não é a corrupção que mais aflige este contribuinte, embora a corrupção seja uma praga epidêmica que precisa ser combatida com todo rigor. Não, este contribuinte não está falando do superfaturamento de obras públicas e do favorecimento em licitações, das sinecuras que sugam o recurso público, qual ervas daninhas, do clientelismo, do tráfico de influência, do peculato, do propinoduto.
 
A dívida pública brasileira, esta sim, é a mais tenebrosa praga e o mais odioso crime que se perpetra contra o povo brasileiro.
 
Somente nos primeiros três meses deste ano (2013), quase sessenta por cento de tudo o que os contribuintes brasileiros pagaram em impostos foram entregues aos “credores” da dívida pública brasileira. Até o dia 1º de abril, foram destinados R$ 325 bilhões principalmente para os especuladores nacionais e estrangeiros.
 
Em 2012, mais de R$ 750 bilhões foram retirados do povo brasileiro e canalizados para os cofres dos bancos nacionais e internacionais. Enquanto, em 2012, mais de 43% do Orçamento Geral da União encheram a pança dos especuladores, míseros 4,17% foram aplicados em saúde; 3,34% em educação; 0,04% em saneamento; 0,39% em segurança pública; 0,05% em cultura; 0,16% em gestão ambiental.
 
Enquanto este contribuinte pagou mais de R$ 47 mil em imposto de renda, os estrangeiros que lucram com os títulos da dívida “interna” brasileira estão isentos de pagar imposto de renda, presenteados que foram com a Lei nº 11.312/2006, editada ironicamente no governo Lula.
 
Este contribuinte não quer pagar nenhum centavo a menos de imposto, mas se sente insultado ao saber que os estrangeiros estão isentos de pagar imposto ao Brasil pelos lucros que auferem com a especulação financeira.
 
É aceitável uma nação com tanta gente necessitada, sem alimento em qualidade e quantidade suficiente para manter-se sã, sem acesso à educação, sem emprego, sem teto e sem terra, entregar para especuladores a metade de tudo que arrecada dos seus filhos?
 
É aceitável que a 6ª maior potência econômica do planeta, seja, ao mesmo tempo, a 85ª em desenvolvimento humano e a 3ª pior em distribuição de renda?
 
Este contribuinte, que honra os seus compromissos e paga as suas contas, não aceita mais sacrificar a sua família em nome de uma “dívida” sobre a qual existem fortes e consistentes suspeitas de que há muito já foi paga pelo povo brasileiro, paga, aliás, à custa da miséria, da fome e do desespero de milhões de brasileiros.   
 
Este contribuinte brasileiro exige que essa dívida seja periciada e auditada, porque tem o direito de saber quando e quanto foi emprestado, quem emprestou e quem tomou o empréstimo, onde foi aplicado o dinheiro emprestado, quem são os credores – um a um -, qual o valor do crédito de cada um, e, principalmente, se o que está sendo pago é justo e efetivamente devido.
 
Se este contribuinte e todos os contribuintes brasileiros são os sacrificados com o pagamento dessa dívida, não é justo que sejamos todos informados a respeito?
 
A auditoria da dívida, aliás, mais do que uma exigência legítima deste contribuinte, é uma determinação expressa da Constituição Federal contida no artigo 26 da ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), segundo o qual, no prazo de um ano da promulgação da Constituição, o Congresso Nacional deveria promover, por intermédio de Comissão Mista, o exame analítico e pericial dos atos e fatos geradores do endividamento externo brasileiro.
 
Suas excelências, os ministros do STF, que se debruçaram por 4 meses no julgamento da Ação Penal 470 (Mensalão), querem que este contribuinte suspeite que a mais alta Corte de Justiça do Brasil não tem coragem de enfrentar os poderosos “credores” de uma famigerada dívida que vale por milhares de mensalões e consome a metade dos recursos do Orçamento Geral de União?
 
O que falta ao STF para julgar a Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 59/2004, impetrada pela OAB, e fazer cumprir o mandamento constitucional que determina a realização da Auditoria da Dívida prevista na Constituição de 1988?
 
Suas senhorias, os deputados e senadores da república, querem que este contribuinte suspeite que o Congresso Nacional não é digno do povo brasileiro, porque não se dispõe a contrariar a banca financeira nacional e internacional que financia a campanha eleitoral de grande parte desses supostos representantes do povo?
 
Este contribuinte brasileiro lastima que todos os presidentes, militares e civis, sem exceção, desde o início do endividamento brasileiro, na década de 1970, até os dias atuais, tenham escondido do povo brasileiro essa roubalheira que é a divida pública.
Todos os políticos que prometem erradicar a miséria, a fome, o desemprego, o déficit habitacional, a falta de saneamento, a precariedade da saúde e da educação públicas, sem estancar esse odioso desvio de dinheiro público, estão mentindo, enganando e abusando da boa fé do povo brasileiro.
 
“País rico é país sem pobreza”, diz a propaganda oficial. Sem, todavia, desmascarar a falácia do endividamento brasileiro, a propaganda não passa de uma fraude, pois seguiremos sendo um país rico – e possivelmente cada vez mais rico – e cronicamente desigual e injusto.
 
Este contribuinte, que não reivindica pagar nenhum centavo a menos de impostos, exige que cada centavo retirado do seu salário e entregue ao governo seja utilizado em benefício do povo brasileiro.
 
Charles Alcantara é auditor Fiscal e presidente do Sindifisco-PA