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03/03/2015

Especialistas defendem elevação de tributo para conter consumo de álcool

A elevação da tributação é apontada por especialistas como uma alternativa para conter o consumo descontrolado da cerveja no Brasil. Enquanto as bebidas frias, que envolvem ainda refrigerantes, águas e isotônicos, estão sem reajustes consideráveis na tributação, outros segmentos têm recebido carga bem mais pesada, como recentemente os casos da energia elétrica e da gasolina.
No mês passado, a presidente Dilma Rousseff sancionou a lei número 13.097, que altera a tributação das bebidas frias. As novas regras vão valer a partir de 1º de maio, mas não há um detalhamento por parte da Receita Federal sobre como essa iniciativa irá impactar no preço final ou na arrecadação. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Cerveja (CervBrasil), foram produzidos 14,1 bilhões de litros em 2014, representando um crescimento de 5% na comparação com 2013.
Defendendo o aumento da tributação, a presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Álcool e outras Drogas (Abead), Ana Cecília Marques, observa que a sociedade desconhece o impacto destrutivo do álcool sobre o corpo. “É fundamental que existam ações de controle para restringir o consumo, assim como é preciso restringir as propagandas e banir a venda para os menores de 21 anos”, afirmou a psiquiatra Ana Cecília, que há 30 anos trabalha na área. Ela ressalta que o consumo pode resultar em cerca de 250 doenças, que vão desde transtornos mentais até acidentes vasculares, e até mesmo provocar a morte.
Responsável pela implantação da Operação Lei Seca, em 2007, no Rio Grande do Sul, José Francisco Mallmann também defende a elevação de tributos. Com experiência de quem passou pela Superintendência da PF e pela Secretaria Estadual de Segurança Pública do RS, Mallmann ressalta que a limitação de acesso à cerveja é pilar importante para a retração do consumo. E isso passa pela elevação dos preços. “Hoje uma pessoa pode adquirir cerveja em qualquer lugar a qualquer hora do dia. Simplesmente não há controle”, ressalta ele.
A preocupação com o controle do consumo está ligada ao prejuízo social provocado pela bebida. Para se ter uma dimensão, o Brasil é o quarto maior consumidor de álcool das Américas. Cada brasileiro bebe uma média de 18,5 litros por ano. “É o grande mal de todos os tempos”, sentencia Mallmann. Segundo dados do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), 0,1% dos brasileiros usa crack, 0,9% cocaína e 2,6% maconha. Já o álcool é consumido por 49,8%. “É impossível aceitar que o álcool ainda seja considerado droga lícita”, assinala.
Nesta mesma linha, Ana Cecília defende o desenvolvimento de uma política pública contra a bebida alcoólica baseada no tripé prevenção, tratamento e redução da oferta. “O álcool deve ser tratado como uma droga. Porém, a cerveja ainda é vista como um alimento. Assim, as ações nunca vão efetivamente se tornar realidade”, alerta a presidente da Abead.
Exemplos de outros países
Alguns países avançaram bastante nas restrições do uso de álcool. De acordo com o Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa), as leis envolvem aumento da idade que permite o consumo até campanhas publicitárias alertando sobre os prejuízos, além de regular o funcionamento de estabelecimentos que vendem o produto. Na maioria das regiões dos Estados Unidos, por exemplo, o consumo e a compra só são permitidos aos maiores de 21 anos.
Há também países que aplicam leis regulando a divulgação. Na Argentina, a “Ley Nacional de Lucha contra el Alcoholismo” (lei nacional de luta contra o alcoolismo), além de proibir o consumo para menores de idade, veda mensagens que levem a acreditar em melhoria de rendimento físico, intelectual ou sexual. No Chile são estabelecidos limites de horário para o funcionamento de bares e lojas em algumas cidades. Na Espanha, as mensagens não podem estimular o consumo excessivo ou menosprezar a abstinência e a moderação. Na Austrália as leis são severas para os crimes que tenham ligação com o consumo de álcool. Há ainda cidades onde a venda tem restrições.
Um estudo inédito realizado na Rússia, envolvendo o Centro de Pesquisa do Câncer do país e também pesquisadores da Universidade de Oxford, além da Organização Mundial da Saúde, mostrou que quando o país adotou um controle mais rígido de consumo de álcool, como aumento de impostos e restrições às vendas, houve decréscimo de um terço neste consumo. O mesmo estudo relacionou o elevado número de mortes precoces no país devido ao uso de álcool, uma vez que esse comportamento resulta em doenças hepáticas, intoxicação por álcool, acidentes e brigas.
Fonte: Correio do Povo