As centrais, confederações, federações e sindicatos devem abrir mão dos quase R$ 900 milhões repassados pelo governo federal anualmente se quiserem aumentar o número de sócios e sua representação perante as empresas. A avaliação não é de um político ou sindicalista de esquerda, mas de Luiz Antônio de Medeiros, fundador da Força Sindical e atualmente secretário-adjunto de Desenvolvimento e Trabalho do prefeito Gilberto Kassab. Ao Valor, Medeiros afirmou que o imposto sindical deixa os sindicalistas “abonados e desinteressados em trabalhar”, uma vez que os repasses federais chegam independentemente de mobilizações, assembleias ou greves promovidas pelos sindicatos.
Antes de assumir, no início do mês, o cargo na prefeitura paulista, Medeiros foi o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho durante o segundo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Medeiros foi o relator da lei que, em abril de 2008, permitiu o repasse de 10% do arrecadado anualmente com imposto sindical às seis centrais – até então, o governo se apoderava de 20%, deixando 60% com os sindicatos, 10% com as federações e 10% com as confederações.
Apenas entre 2008 e 2009, as centrais dividiram entre si um bolo de R$ 146,5 milhões. O número de 2010 ainda não foi divulgado. “Se eu não tivesse colocado como critério para receber o imposto sindical o mínimo de 5% de representatividade, no mesmo dia iriam surgir centenas de centrais só para abocanhar o dinheiro”, diz o sindicalista, em referência ao critério que leva em conta o número de sindicatos e trabalhadores sindicalizados ligados às centrais.
“Até o início da década, só dois países tinham imposto sindical: o Iraque e o Brasil. Depois que os americanos destruíram o Iraque, só nós continuamos com esse imposto, que todo trabalhador paga independente de sua vontade”, diz Medeiros. Para ele, os sindicalistas estão criando sindicatos como forma de vida, não como “espaço para representação dos trabalhadores perante as empresas e o governo”.
Para ele, os ganhos salariais do movimento sindical brasileiro no ano passado – quando, segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Socioeconômicas (Dieese), o equivalente a 95,7% das categorias obtiveram reajustes salariais iguais ou acima da inflação – poderiam ser “muito maiores” caso os sindicatos “precisassem registrar acordos melhores para sobreviver”. “Como têm o dinheiro fácil do imposto sindical, ninguém precisa fazer greve, mobilizar o trabalhador, nada”, diz.
No início do mês, os dirigentes da CUT, a maior central do país, aprovaram a realização de uma campanha nacional contra o imposto sindical, que, para a CUT, deve ser trocado por uma taxa negocial. Isto é, uma taxa que seria aprovada em assembleia pelos sindicatos, e que seria cobrada dos trabalhadores representados. Assim, explica Artur Henrique, presidente da CUT, “só ganharia dinheiro aquele sindicato que lutasse, porque o trabalhador passaria a pagar a taxa só se sentir que vale a pena, não de maneira compulsória, como é hoje”.
Para Adi dos Santos, presidente da CUT-SP, o debate em torno do imposto sindical é “de vida ou morte” para a entidade, que têm em seu estatuto de fundação, de 1983, a disposição de não aceitar o imposto sindical. A CUT, no entanto, é a que recebe a maior fatia da contribuição, e à exceção de seus maiores sindicatos, como dos bancários de São Paulo e dos metalúrgicos do ABC, que devolvem o que recebem do governo, todos os outros fazem uso dos recursos. “O imposto não serve para sustentar sindicatos, como dizem aqueles que dependem dele, mas para sustentar sindicalistas”, diz Santos.
Pouco antes de o repasse de 10% do arrecadado anualmente com o imposto sindical ser aprovado pelo governo Lula, nada menos que três centrais foram criadas. Enquanto a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) nasceu de um racha na CUT – justamente porque o grupo, ligado ao PCdoB, apoia o repasse de imposto sindical -, outras duas – a Nova Central de Trabalhadores do Brasil (NCST) e a União Geral dos Trabalhadores (UGT) – vieram da Força Sindical. Além destas cinco, a Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), herdeira da antiga CGT, criada no governo Getúlio Vargas, também entrou no bolo.
Para o pesquisador Claudio Dedecca, da Unicamp, os resultados recordes obtidos nas negociações coletivas ao longo do ano passado não justificam o argumento das centrais de que o movimento sindical está consolidado. Ao contrário, diz Dedecca. “É impossível elencar três pontos do pensamento e da ação sindical e política de cada uma das seis centrais. Elas não se diferenciam, existem apenas para receber o dinheiro, e por isso apoiam o governo”, afirma.
Para Ricardo Patah, presidente da UGT, o imposto sindical, por ser compulsório, evita que práticas anti-sindicais das empresas – como cartas escritas pelos departamentos de recursos humanos que liberam os funcionários de taxas assistenciais aprovadas pelos sindicatos em convenções coletivas – “travem” a atividade das entidades. “O imposto sindical torna o movimento independente das relações de subserviência com as empresas”, diz Patah.
De acordo com João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da Força Sindical, o imposto sindical não pode ser simplesmente banido, uma vez que o sistema atual depende integralmente dele. “O Ministério Público também não ajuda, uma vez que tem atuado contra a taxa assistencial, deixando as entidades cada vez mais dependentes dos repasses federais”.
Fonte: Valor Econômico