Uma audiência pública será realizada na Assembleia Legislativa do Pará (ALEPA), no dia 15 de outubro, a partir das 8h, para debater quais impactos serão sentidos nos repasses de recursos financeiros dedicados ao estado e municípios devido a crise financeira. O evento também tem o intuito de apresentar medidas alternativas para o aumento da arrecadação federal, a começar pela busca de solução do impasse estabelecido pelo Governo com os Auditores da Receita Federal que se mantêm em greve.
O objetivo do evento é proporcionar o diálogo entre Auditores Fiscais da RFB, deputados e sociedade sobre saídas para a crise econômica que compromete as atividades dos Estados e municípios. “Nosso desejo é interagir com a sociedade, afinal é para ela que se destina o produto de nossa mais importante missão, prover o Estado Brasileiro dos recursos financeiros que garantem a realização das politicas publicas necessárias ao bem estar de seus cidadãos. E onde estas políticas são realizadas se não nos Estados e, sobretudo nos Municípios onde vivem as pessoas?” diz Sérgio Pinto, diretor do Sindifisco Nacional no Pará, entidade dos Auditores da Receita Federal do que solicitou a realização do evento.
A exemplo do que ocorre com outros estados e municípios, principalmente do Norte e Nordeste do país, o Pará e seus 143 municípios figuram entre os mais afetados com o baixo desempenho da economia e da consequente queda da arrecadação federal. Isto porque os montantes de recursos transferidos pela União a estes entes federativos tem forte impacto sobre as suas Receitas. Até o mês de agosto de 2015, o governo federal repassou para o Fundo de Participação dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM) 227 bilhões de reais. Do total deste valor, 11 bilhões foram destinados ao estado do Pará e 7 bilhões de reais aos 143 municípios. A cidade de Abaetetuba, por exemplo, recebeu 82 milhões de reais oriundos do FPM, e para o Fundo Municipal de Saúde a cidade obteve 16 milhões. Apesar da boa evolução da participação da Receita própria sobre a sua Receita Total o montante repassado pela União ao Estado do Pará ainda possui influência significativa. Em 2014 estes valores representaram expressivos 40%. Para o município de Belém o valor do FPM em 2014 somou o equivalente a 60% de sua arrecadação própria. A Constituição determina que a União repasse ao FPM um total de 23,5% do produto líquido da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Esses números apontam a importância dos Fundos nas Receitas de estados e municípios e geram um alerta: Devido a crise econômica, e a falta de diálogo e negociação efetiva do Governo Federal com Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil em greve desde agosto, quais os riscos desses repasses serem ainda mais afetados?
Medidas alternativas para crise econômica
Segundo, o Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil, Marcelo Lettieri, que palestrará no evento sobre “ A atuação do auditor fiscal como alternativa para queda da arrecadação federal – a saída pela Receita” existem medidas fiscais que não cortam benefícios sociais e mantém a arrecadação e, em consequência, impedem ou atenuam os efeitos negativos sobre os repasses a estados e municípios.
De acordo com o professor doutor Marcelo Lettiere existem ideias alternativas idealizadas por Auditores Fiscais da Receita para a crise econômica. Os estudos apontam possíveis soluções a curto, médio e longo prazo. Uma delas é a análise das declarações de compensação. Ele ressalta que várias empresas declaram que possuem crédito a receber da Receita Federal; com isso, deixam de pagar os tributos por um período, até o julgamento do caso.
Outro ponto para melhorar rapidamente as contas consiste na arrecadação dos tributos sobre lucros e dividendos, que atualmente são isentos de impostos. “Essa era uma situação temporária, criada em 1996, durante o período das privatizações, e ficou para sempre”, afirma. Somente com essa medida, ele diz que se arrecadaria R$ 70 bilhões por ano.
Os auditores também sugerem mecanismos sobre o capital próprio. Lettieri conta que hoje uma pessoa que ganha R$ 10 mil paga 27,5% de imposto. Já um sócio de uma empresa, com os mesmos R$ 10 mil não paga nada. Ele diz que bastava cobrar a mesma alíquota para arrecadar mais R$ 20 bilhões. A última proposta, na visão do auditor, não teria nenhum impacto nas taxas de investimentos, que permanecem inalteradas nos últimos 20 anos (18% do PIB). “O gráfico da taxa de investimento parece o eletrocardiograma de um morto”, acrescenta. Com essas questões, não precisaria nem entrar em polêmicas como a cobrança de imposto sobre grandes fortunas, embora a proposta também esteja entre as listadas pelos auditores, veja algumas ideias:
1 – Tributação da distribuição de lucros e dividendos: R$ 70 bilhões de arrecadação/ano;
2 – Tributação normal dos juros sobre capital próprio: R$ 15 bilhões de arrecadação/ano;
3 – Instituição do Imposto sobre grandes fortunas: 12,6 bilhões por ano (se for adotado o modelo francês);
4 – Recuperação de passivos tributários (superiores a R$ 500 bilhões). Se recuperados 10%, haveria um potencial de 50 bilhões/ano;
5 – Redução da sonegação/ evasão/elisão (10% = 50 bilhões – Fonte: Sonegômetro);
6 – Atuação mais efetiva da Receita Federal (contra lavagem de dinheiro, financiamento via compensações, operações focadas etc.).
PEC 186
Além de alternativas para a crise financeira, os auditores fiscais da RFB também apontam medidas que fortalecem o estado e proporcionam autonomia. É o caso da PEC 186, que prevê uma Lei Complementar que estabelece normas gerais à Administração Tributária da União, dos Estados e dos Municípios, e assegura autonomia administrativa, financeira, orçamentária e funcional às Administrações Tributárias.
Na prática, a PEC aprovada resultaria numa Lei Orgânica do Fisco federal (LOAT) e estabeleceria um fisco forte e instrumentalizado, capaz de arrecadar recursos suficientes para a promoção de políticas públicas que beneficiam a sociedade brasileira.
Na audiência pública do dia 15 haverá a palestra sobre o tema proferida pelo diretor de comunicação da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (FENAFISCO), Charles Alcantara.
Greve na Receita
Em greve desde abril deste ano, os auditores fiscais da Receita encontram-se em meio a este cenário de desvalorização da instituição e do cargo que arrecadam para o país. As medidas do ajuste fiscal prejudicam serviços essenciais como a Farmácia Popular, “se o Governo tiver vontade política pode implementar alternativas pela lógica da Receita, sem impor o pagamento da conta da crise sobre quem não a gerou”. Conclui Sérgio Pinto, representante do sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal.
A greve dos Auditores já começa a dar os primeiros resultados que afetam a arrecadação. Nos meses de agosto e setembro são cerca de 14 bilhões a menos em lançamento de crédito se comparado com o mesmo período de 2014. Só no Pará, segundo dados obtidos na Delegacia da Receita Federal Belém (DRF- Belém), no ano de 2014, no período de janeiro a agosto, os Auditores-fiscais lançaram crédito no total de 3 bilhões e meio, já durante os primeiros oito meses do ano de 2014, este montante caiu para 1 bilhão e 700 milhões. “Sabemos da importância de nosso papel, porém o Governo não sinaliza no sentido de abrir diálogo efetivo conosco, o que, infelizmente, só agrava a situação”, aponta o vice-presidente da DS Pará Amapá, Sérgio Pinto.