Em artigo publicado nesta sexta-feira (09) no jornal O Liberal, o presidente do Sindifisco Pará, Charles Alcantara, critica a isenção dos prêmios dos atletas olímpicos. Segundo ele, a medida deseduca a população sobre a importância dos impostos.
ISENÇÃO DE PREMIAÇÃO OLÍMPICA É UM DESSERVIÇO À CIDADANIA
*Charles Alcantara
A isenção concedida pelo governo Lula sobre os prêmios em dinheiro pagos aos medalhistas olímpicos pode parecer louvável e certamente contará com o apoio da chamada opinião pública, mas, na verdade, acaba por prestar um grande desserviço à cidadania, que pressupõe deveres e direitos.
Editada sob forte comoção popular produzida no ambiente insalubre das redes sociais, a Medida Provisória n° 1.251, de 27 de agosto de 2024, confirma a “Lei de Gerson” e reforça a deslegitimação social do imposto, que só favorece a quem tem poder e prestígio neste país que teima em se manter no pódio dos mais desiguais do planeta.
Não se trata de desmerecer o valor simbólico e real das medalhas trazidas pelas atletas brasileiras (aqui, opto pelo substantivo feminino em razão da predominância das mulheres medalhistas). Trata-se apenas de escolher a maneira ética e civicamente adequada de render homenagem a essas mulheres e homens.
Ao isentar de imposto o valor do prêmio em dinheiro pago às(aos) atletas que subiram ao pódio, a mensagem primeira é de que imposto se assemelha a penalidade, castigo ou desprestígio.
Que problema há na cobrança de imposto sobre um prêmio em dinheiro recebido por uma (um) medalhista olímpica(o)?
Que lição a sociedade brasileira recebe com essa medida?
A de que imposto é um mal em si, e de que o país seria melhor sem essa “praga”?
Nesse mesmo ambiente quase irrespirável das redes sociais, acompanhei o “debate” (posto entre aspas, porque é impossível haver debate nesse ambiente) sobre o extraordinário Programa Bolsa-Atleta, criado em 2005. De onde vêm os recursos desse programa, afinal, senão dos impostos?
Havia – e há – maneiras criativas, e educativas, de homenagear e incentivar o esporte e a cultura pátrios. A MP n° 1.251/2024 foi uma resposta ruim a um apelo perigoso com forte potencial para enredar o governo.
- Ah, mas o valor da isenção é insignificante para a arrecadação tributária, ao passo que muito significativo para a grande maioria das(os) atletas que dedicam a vida ao esporte!
Fato. Acontece que a questão não tem a ver com valores monetários, mas com os valores que devem fundar e sustentar uma nação democrática, justa e solidária.
Não é pela expressão do valor do imposto que seria recolhido aos cofres públicos, que de fato é inexpressivo. É pela expressão da mensagem.
Hoje, as(os) medalhistas olímpicas(os); amanhã, os jogadores milionários da seleção brasileira de futebol que se sentirão no direito a receberem essa “homenagem”, em reconhecimento ao “favor” que fizeram ao país.
Enfim, havia – e há – maneiras criativas e educativas. De pronto, vislumbro duas: o Comitê Olímpico Brasileiro poderia estipular o mesmo valor do prêmio financeiro, mas já líquido de impostos, que seriam recolhidos diretamente pelo COB aos cofres públicos; ou, o governo federal editaria uma MP que concedesse, no âmbito do Programa Bolsa-Atleta, uma bolsa especial (Bolsa-Prêmio), às(aos) atletas olímpicos que conquistassem medalhas, num valor suficiente para compensar o valor do imposto.
A MP da isenção foi desinteligente, porque açodada; e açodada, porque feita sob inspiração populista.
Os dividendos políticos ao governo são efêmeros, mas os prejuízos à cidadania, duradouros.
*Auditor Fiscal de Receitas Estaduais e presidente do Sindifisco-Pará